Já escrevi para os meus filhos, para irmão, para minha mamãe, para amigo, mas faltava ainda escrever pro senhor. Vou escrever esse texto ouvindo a música Pai, sabe por quê? Porque muita coisa que ele canta nessa música aconteceu com a gente.
Ninguém sabe e nem nunca viu, mas todo ano no dia dos pais coloco essa música pra tocar e não consigo conter as lágrimas. Passa sempre um filme, um longa metragem na minha cabeça, em trinta e nove anos muitas coisas boas e ruins aconteceram, então é difícil não chorar.
Lembro que quando era moleque tinha o sonho de ser jogador de futebol – assim como todo moleque daquela idade – e o senhor várias vezes, ouvindo aos meus pedidos, me levou para treinar nos clubes aqui de Manaus. E o senhor acreditava muito naquele baixinho magrelo. Lembro da gente cortando caminho por dentro do cemitério para chegar mais rápido lá no Nacional Clube. O senhor lembra disso? Pois é, cortamos caminho, encurtamos a distância, mas eu fracassei e o meu sonho ficou lá onde cortávamos caminho, mas nem por isso o senhor me criticou.
Na primeira vez que disputei os jogos estudantis – as Olimpíadas dos estudantes – o senhor estava desempregado e com todos os problemas do mundo desabando na sua cabeça, mas não demonstrava, a figura de um homem forte é o que ficou na minha retina e sempre que pôde me acompanhou nos jogos, ah! Como eu achava legal, me achava na obrigação de fazer um gol. Queria marcar o gol e correr para os seus braços, mas a minha frieza glacial não me permitia fazer isso.
Outra lembrança forte que tenho envolve futebol também. Estávamos lá no Estádio da Colina pra assistir a Flamengo e Rio Negro pelo campeonato brasileiro de 86, eu acho. O estádio estava lotado, eu jamais levaria o meu filho num jogo daquele, mas o senhor me levou porque sabia que eu adorava futebol. Nunca tinha visto tanta gente reunida num lugar só, lá no meio da galera o medo foi tomando conta de mim, achava que aquilo ali ia desabar, olhava pro senhor e o homem forte tava ali, implorei pra sair dali, mas o senhor segurou a peteca e me protegeu.
Quando a mamãe esteve à beira da morte, olhava ao redor e todos estavam fragilizados, então olhava para o senhor e lá estava aquele homem forte, parecia que nem era com o ele. Só Deus sabia como ele estava se sentindo naquele momento.
Hoje me pergunto: De onde será que vem tanta inteligência emocional? Sinceramente não sei, ou sei? Na verdade acho que vem de uma infância dura, um caminho rodeado de espinhos e cacos de vidros, poucos recursos financeiros e afeto quase nenhum. Foi descobrir o que era beijo e abraço com a primeira namorada.
Começou a trabalhar muito cedo e teve sua infância roubada, teve que amadurecer e virar o homem da casa, já que o pai, sabe Deus por onde esse andava.
Acredito eu que tudo isso tenha contribuído para torná-lo forte e resoluto ao mesmo passo em que dar vazão aos sentimentos, externar suas angústias e seus medos o inibe ao ponto de passar uma imagem estóica, de quem não tem amor no coração.
Mas nos últimos anos a imagem de herói foi ficando arranhada, nossas diferenças ficaram ainda mais latentes e o menino aqui cresceu e viu coisas que não concorda e o senhor sabe do que estou falando. Minha mãe não merecia e nem merece passar...Enfim, apesar de tudo que tem acontecido nos últimos anos, ainda quero guardar a imagem do herói e não do bandido.
terça-feira, 8 de junho de 2010
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Paulo, este teu post é para arrancar lágrimas de qualquer ser, ainda mais eu, que já sou emotiva ao extremo.
ResponderExcluirBem, pais antes de tudo são seres humanos, erram, acertam e assim seguem vivendo. Perdi meu pai quando nem tinha 3 anos de idade completos, em um trágico acidente de moto ele se foi. Tudo que tenho dele são fotos e descrições de familiares e amigos de que ele era uma pessoa encantadora, sempre alegre, cheio de sonhos, divertido, com pressa de viver...que amava muito minha jovem e bela mãe e os 2 filhos que ela deu a ele, que formavam um casal lindo e apaixonado...e nada mais que isso. Palavras e imagens, sequer lembro de um toque seu, da sua voz, por mais eu eu tente e tente e tente...
Que bom que pudeste conviver com o lado herói do seu pai, e quanto ao outro lado, bem...este tem que ser não ignorado, mas pelo menos não exaltado. Deixe viver este herói no seu coração e ame-o até quando lhe for permitido, esta vida é breve demais...
Beijos,
Kenia.
Uau que post lindo e emocionante...beijos!
ResponderExcluirShe
Nossa, me lembra tanto Kafka, carta ao pai...
ResponderExcluirParabéns "fessor"