domingo, 8 de fevereiro de 2015

Um outro mundo existe...


Já previamente avisado que a turma X do ensino Y era casca grossa, tomei uma dose de cuidados redobrados. Confio muito no teor de convencimento da minha cachaça. Dizem que nos primórdios a danada era usada lá pelas bandas do nordeste para amolecer carne de porco selvagem. Então, foi com ela que abri os serviços. Antes porém, temperatura do estômago: Zero grau. Coisa natural da primeira aula. Frio agasalhado, hora de exorcizar a fama de bad boys daqueles "sabem de nada, inocentes".
De mochila nas costas, all star, camisa de meia e meu velho guerreiro jeans desbotado, entrei na sala meio que despercebido. Eles estavam entretidos numa conversa pra lá de animada. E aí moçada, de boa? O com pinta de líder de black blocs logo catapultou um "Olha aí, professor garotão na área!"
Olhei pra ele com o mesmo olhar que olhei para a atitude da Sheislane. Mas o enterro seguiu e me apresentei ainda em meio àquela patuscada. Sentei sobre a mesa e abri o livro da minha vida. Paulatinamente eles foram se interessando pela minha conversa (a)fiada.
Quando mencionei a Sharp e a Transbrasil, empresas que tive o desprazer e o prazer de trabalhar. Isso! exatamente nessa ordem. Interrompendo a minha fala um eco de "Pé frio o senhor, hein!" flutuou na acústica daquela sala. A gargalhada foi coletiva. A essa altura do campeonato eles já não interagiam entre eles, só comigo.
O bate papo informal e motivacional foi encerrado com um verso de Mário Quintana. Pois falava da importância da leitura e fiz questão de frisar: Moçada, não se esqueça que "Um outro mundo existe..."
Rolou um aplauso no final e um "esse professor é rodado, moleque!" em voz masculina. Foi interessante ver a mudança de feição daqueles jovens já meio calejados da mesmice de nossas aulas. Enquanto falava me lembrava do videoclip de Black and White do Michael Jackson. Mas o motivo que me levou a redigir esse texto, pois deveria estar preparando minhas aulas de amanhã, foi o aluno com pinta de líder black blocs ir até a minha mesa e dizer: Professor, hoje o senhor me fez acreditar que um outro mundo existe.

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