domingo, 30 de março de 2014

Carrossel da saudade


Reunir com amigos de fé tem o poder de rejuvenescimento. Seja qual for o lugar escolhido para o encontro e ele logo vira o nosso playground cujo brinquedo favorito são as palavras. Fazemos delas a gangorra de nossas piadas, a cama elástica de nossas canções favoritas, o gira-gira de nossas vidas, o escorregador de nossas dores.
No playground dos quarentões é o carrossel da saudade que nos reúne em qualquer esquina, em qualquer praça, em qualquer terreiro, seja ele de terra batida ou de porcelanato esmaltado, seja o encontro regado a coxinha ou lasanha, guri cola ou coca-cola, sangue de boi ou um bom vinho chileno, o importante é o reencontro, o abraço caloroso, o beijo carregado de carinho, a sinergia, e principalmente a admiração que um tem pelo o outro.
Acordo tácito de nossas reuniões itinerantes: Entrar sem a pressa e a caretice da vida adulta. O barato do playground é a perda da noção do tempo. Investir em memória exige desapego. É um ingresso que custa caro, mas vale a pena. E encontrar com esse povo sempre vale a pena. Ontem foi rápido como um rato que atravessa a sala, porém foi gostoso como todas as outras vezes. Voltei para casa rejuvenescido.

sábado, 8 de março de 2014

Coisa boa é mulher

Coisa boa é mulher que madruga pelo nosso bem estar, lava, passa, cuida da casa, dos filhos, faz almoço, janta e café.
Coisa boa é mulher que soma, divide, multiplica, se anula, nos bajula, é moderna, antiquada, espirituosa, emburrada, é do jeito que o homem quiser.
Coisa boa é mulher que até nos dias de cólica atura nossas noites de bebida alcoólica. E quer prova maior de generosidade? Experimenta ficar bêbado e você será servido de um revigorante caldo de caridade.
Coisa boa é mulher que nas noites de frio nos aquece a alma arrepiando até os mais recônditos pêlos, e, ainda entretido pelo cigarro, recebemos aquele cafuné.
Coisa boa é mulher que quando o bicho pega pro nosso lado ainda está ali tal qual Madre Teresa de Calcutá, prenhe de fé, pronta pro que der e vier!
Coisa boa é mulher que à la Joana D'arc vai à luta, entra na guerra, morre queimada, mas não arreda o pé!
Coisa boa é mulher que uma vez emancipada é capaz de cometer suicídio para não mais voltar ao regime escravocrata a exemplo de Dandara, esposa do Zumbi dos Palmares.
Coisa boa é mulher que suaviza a aspereza masculina, dá curvas a linhas retas, perfuma nossos dias, traz a poesia no jeito de andar pro masculinizado mundo sem poemas.
Coisa boa é mulher que é colírio, bálsamo, morfina, música, ópio, irmã, filha, tia, madrinha, esposa, amante, MÃE, sublime criação da natureza.
Coisa boa é mulher que é paradoxo, pararaio, paralama, parachoque, paraquedas, parabrisa, para trânsito!
Coisa boa é mulher que nos aceita na doença, na tristeza, com dinheiro ou sem dinheiro, contanto que tenhamos o bicho de pé!
Então ilustre poeta Thiago de Mello, peço-te a gentileza de reescrever o Estatuto do Homem e faça-me o favor de incluir o décimo quarto parágrafo, que será: Fica decretado a partir de hoje que coisa boa é mulher!

terça-feira, 4 de março de 2014

Vou ali comprar cigarro



Sábado gordo de carnaval. "Vou ali comprar cigarro". Desculpa desbotada até de quem nunca, sequer, acendeu um cigarro só para tragar as festas de Momo à todos pulmões. E o cara só volta na quarta-feira de cinzas com a conta bancária mais magra que o rei Momo da Etiópia, e pior, vai comer ovo até o próximo pagamento fazendo jus a expressão "adeus à carne", do latim carne vale. Agora, quem nunca deu uma tragadinha nessa folia que atire a primeira bagana.
Aproveitando a escapulida enrolado na cortina de fumaça causada pela porção de ilusão que é o carnaval, o sujeito extravasa desejos escondidos e reprimidos nos escaninhos da alma sem nem se importar com o cantar do galo. Contrariando a máxima de que o corpo é a prisão da alma, o folião semi alforriado libera geral e dá vazão as fantasias no choro do cavaco e toque do tamborim.
Imagina um homem sambando de salto agulha dentro de um tubinho preto básico lá no bloco das Piranhas? Pois é, o carnaval tem esse poder, ou a alma frouxa dá esse poder. Poderosa, essa é a verdade, homens querem ter a sensação de como é ser poderosa. Porém não esqueçamos, quarta feira de cinza é hora de voltar pra casa de terno e gravata, uma carteira de cigarros na mão e uma boa explicação para dona Encrenca.

E o sol da liberdade?



O dia amanheceu cinzento. Aonde foi parar o sol da liberdade em raios fúlgidos? E o povo heróico que conquistou o penhor da igualdade com braços fortes? Será que ficou na porta estacionando os carros?
Alguém, por favor, salve! salve! minha Pátria amada, terra adorada, tão bela, porém agora programada pra só dizer sim. O gigante - pela própria natureza - acordou, foi às ruas de cara pintada. Não mostrou a cara. já não é mais forte. Será que é o teu fim?
Minha Pátria atravessou a rua sem olhar para os dois lados. Desafiou a própria morte. E tudo indica que ficarás eternamente deitada aos brados retumbantes. Ó mãe gentil, por onde andaste que nunca aconselhaste seu filho a não aceitar nada de estranhos? Brasil, quem te ofereceu esse cigarro com a promessa de lindos campos prenhe de flores?
Agora tu ergues da injustiça a clava forte e sua imagem resplandece as margens plácidas. Qual é o teu negócio? Paz no passado e glória no futuro? Desse jeito até quem te adora fugirá à luta. Pensando seriamente em ir em busca de terras mais garridas