domingo, 20 de setembro de 2015

Vestido azul

Ela caprichou no vestido. Era um azul floreado cujo corte conservador representava muito bem o seu estilo setentona. Mamãe, dentro de sua simplicidade, gostava de se vestir bem. Aos setenta anos ainda lhe restava um punhado de vaidade.
Mas o vestido azul não estava combinando com seu sorriso amarelo. Ela estava indo fazer mais uma cirurgia e dessa vez mamãe pintava um medo que, confesso, poucas vezes vi estampado em seu semblante. Dona Nonata era corajosa, não era homem, mas tinha aquilo roxo!
Enquanto a cirurgia acontecia, eu, meu pai e meus irmãos aguardávamos no saguão do hospital envoltos em uma conversa tranquila. Na verdade a tranquilidade estava ali de laranja. A tensão se revelava nos estalar de dedos, nos pés que não paravam de marcar o tempo, no senta e levanta aqui e acolá e no de vez em quando “Tá demorando, né?”
Após algumas longas horas de espera veio a notícia de que a coisa tinha ficado preta. A cirurgia complicou. Mamãe resistiu bravamente aquela noite de trinta e um de Outubro. Dia das Bruxas. Porém foi no desbotar da noite que ela descansou. Mamãe entrou de azul naquele hospital e nós saímos de preto. E nós… ainda não saímos dessa dor. Vira e mexe a saudade dá nas minhas duas. Como hoje logo que vi a foto do vestido azul da minha mãe.
Bença mãe!

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